terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Jovens e empresários


Aos 28 anos, João Augusto já é dono de sua própria empresa e começa a se destacar no mercado
Aos 28 anos, João Augusto já é dono de sua própria empresa e começa a se destacar no mercado (Antônio Lima)
Estudo da Ilumeo – empresa de pesquisas de mercado – aponta que 40% dos jovens que estudam ou trabalham com tecnologia querem abrir um negócio próprio nos próximos anos. Em outras áreas, esse índice pode ser menor, mas não resta dúvida que o ímpeto do empreendedorismo é marcante na faixa etária até 30 anos. O consultor em gestão de pessoas, Eduardo Ferraz, destaca, no entanto, que, mesmo com tanta disposição, bem poucos terão sucesso na iniciativa.
O especialista enfatiza os principais obstáculos na vida dos jovens empresários de primeira viagem: falta de investimento inicial, falta de capacitação técnica e falta de conhecimento sobre administração e mercado. Em Manaus, jovens empreendedores conhecem bem esses percalços, e dão a receita para superá-los.
O arquiteto João Augusto Pinheiro, 28 anos, estudou o mercado, buscou diferenciais, investiu em capacitação e abriu seu próprio negócio, a J. Augusto Arquitetura & Construção. A empresa já tem projetos de porte no portfólio e começa a se destacar no concorrido mercado local.
Antes de se lançar na aventura empreendedora, o arquiteto se preparou: ampliou sua visão profissional na Universidade de Coimbra, em Portugal; de volta a Manaus, trabalhou em escritórios de arquitetos renomados. “Isso me possibilitou um aparato técnico e percepção de diversas fases e organização de um escritório consolidado”, conta.
Segundo Eduardo Ferraz, preparação e planejamento são passos fundamentais muitas vezes menosprezados pelos jovens. “Qual a real necessidade financeira? Como vender o produto? Fazer uma análise detalhada de mercado e saber em quanto tempo começará a dar lucro também são pontos importantes. Com isso em mãos fica mais fácil atrair sócios ou investidores”, orienta.
Executivos precoces, resultados expressivos
Para o empresário Beto Pontes, 31, especialista em Gestão de Pessoas e administrador da rede de salões Amanda Beauty Center, a pouca idade não foi um fator negativo para conquistar o crescimento profissional. Muito jovem e filho único, Pontes assumiu a gestão de um salão de beleza aos 23 anos, após a morte de sua mãe, em 2005. Na época, Pontes concluía o curso de Administração e aceitou o desafio de dar continuidade ao negócio da família.
Apesar da pouca experiência de gestão, Pontes conseguiu ampliar o número de lojas em oito anos, passando a adquirir três unidades em centros comerciais de Manaus e está na expectativa de inaugurar o quarto empreendimento neste semestre, no Shopping Ponta Negra.
“Embora tenha participado do funcionamento do salão e ter ajudado minha mãe na administração, tive que aprender muitas coisas novas. Fazer cursos. Conhecer novos empreendimentos. Participar de feiras do segmento para obter todo conhecimento necessário. E, claro, o sucesso veio com o tempo”, revela, ao destacar que o jovem precisa acreditar no que faz e ter perseverança.
Esta é a mesma receita seguida pelo engenheiro Frededico Amim, sócio da Jetcasa Pintura. Ele conta que, para adquirir um pouco mais de know-how, chegou a trabalhar por ano em uma empresa privada, adquirindo experiência e conhecimento. “Passei um ano trabalhando. Depois pedi para sair e montar meu próprio negócio. Tive muitas dificuldades, mas foram e são superadas gradativamente”. Apesar da empresa ainda ser nova, já obteve muitas conquistas.
Tem que ter perfil certo
O consultor Eduardo Ferraz saliente que os candidatos a empresários precisam avaliar se têm perfil para isso antes de iniciar o projeto. “Ele precisa ser determinado, saber comandar, conseguir trabalhar sob pressão, ter alta tolerância à frustração e não ter medo de arriscar. O histórico de vida dará claras indicações se o jovem tem estas atribuições”, diz.
Caso o jovem não tenha uma ou mais dessas qualidades, ainda poderá empreender, mas é altamente aconselhável encontrar um sócio com as características que lhe faltam. Além disso, deverá estudar para aperfeiçoar suas próprias qualificações.
Os programas do Sebrae, em todo o Brasil costumam ser muito úteis para empreendedores iniciantes. A Fundação Getúlio Vargas também conta com cursos livres desenhados para essa finalidade.

Reunião entre Fazenda e empresários busca um plano B para o Difa em SC


O secretário de Estado da Fazenda Antonio Gavazzoni reúne-se nesta terça-feira, às 10h, com entidades empresariais em busca de uma alternativa ao Decreto 1.357/13, que estabelece o Diferencial de Alíquota (Difa) que, na prática, cobra um adicional de cinco pontos percentuais no ICMS da empresa que comprar um produto de outro Estado. A medida gerou reação do comércio e é discutida na Justiça.
Desde a semana passada, a equipe técnica da Fazenda trabalha em simulações de planos alternativos que serão apresentados hoje. Mas o próprio governo reconhece que uma solução que agrade a todos os lados pode exigir mais tempo. A Federação das Indústrias de SC (Fiesc) encaminha, nesta terça-feira pela manhã, documento que propõe cinco alterações no decreto.
A diretoria da Federação das Associações Empresariais de SC (Facisc) participa do encontro na expectativa de ouvir uma contraproposta efetiva.
— Nossa posição é de revogação ou suspensão do decreto. O governo é que ficou de apresentar uma nova alternativa — afirma o diretor-executivo da federação, Gilson Zimmermann.
Para o presidente da Facisc, Alaor Tissot, a medida tira a competitividade das empresas, principalmente as optantes pelo Simples Nacional.
Enquanto o governo busca um acordo, o caso também é discutido na Justiça e na Assembleia Legislativa. A Facisc encaminhou mandado de segurança com pedido de liminar para suspender o decreto ao Tribunal de Justiça do Estado no dia 13 deste mês. O pedido está nas mãos do desembargador José Volpato de Souza, que solicitou manifestação por parte do governo do Estado.
Na assembleia, a bancada do PT protocolou um Projeto de Sustação de Ato (PSA) para anular os efeitos do decreto. Segundo o assessor jurídico do partido, Luiz Fernando Carvalho, o próximo passo é o projeto ser avaliado pela Comissão de Constituição e Justiça, o que pode ocorrer nesta semana. Se acolhido pela comissão, o Executivo será notificado e terá o prazo de 10 dias para se manifestar.
Medida teria sido adotada por outros estados primeiro
A Fazenda de SC ressalta que, apesar da repercussão entre as entidades, o Difa não é novidade: tem origem em lei federal de 2006 e é regulamentado em praticamente todos os estados.
Segundo o artigo 13 da mesma lei, o recolhimento pelo Simples não exclui a incidência do diferencial. Embora a instituição da medida tenha causado queixas entre alguns segmentos, o governo lembra que o Estado concede outros benefícios às micro e pequenas empresas.
O novo decreto é apontado como uma medida para proteger a indústria local diante da resolução no 13 do Senado, que unificou a alíquota em 4% nas operações interestaduais com mercadorias importadas, tornando mais vantajosa a compra de produtos de outros estados.

Projeto inclui pessoa jurídica em crimes de corrupção


O Projeto de Lei 4.895/2012 está pronto para ser votado na Câmara dos Deputados, trazendo como novidade a inclusão de pessoas jurídicas entre os agentes que podem responder por crime de corrupção. De acordo com a proposta, empresas ou organizações não-governamentais (ONG) que incorrerem nesse tipo de crime ficarão sujeitos a multas no valor de 10% a 25% do faturamento bruto do ano anterior ao ato. Além disso, serão impedidas de contratar com o Poder Público pelo prazo de três a seis anos.
Os envolvidos — tanto empresários quanto seus funcionários e servidores públicos — ainda poderão ser responsabilizados individualmente, com o agravamento das penas. O texto cria, ainda, a forma penal "corrupção ativa", com pena prevista de 3 a 12 anos de reclusão.
A propósito, o projeto torna mais rigorosas as punições para os crimes contra a administração pública. Atualmente, o Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940) prevê pena de 2 a 12 anos de reclusão para o crime de corrupção. A proposta amplia essa pena para 3 a 12 anos; e estabelece punição de 4 a 15 anos para a chamada "corrupção qualificada".
O projeto define os casos de corrupção qualificada da seguinte forma:
- o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício, pratica-o infringindo dever funcional, viola lei ou normas administrativas;
- causa elevado prejuízo ao erário ou ao patrimônio público;
- desvia valores ou bens, causa prejuízo ou mal uso de recursos destinados a serviços públicos essenciais (saúde, educação, previdência, assistência social, segurança pública ou atendimento a emergências).
O texto também inova ao imputar as mesmas responsabilidades de funcionário público a todo agente que administre recursos públicos, ainda que recebidos em caráter de convênio ou repasse voluntário. O objetivo da medida é enquadrar dirigentes de organizações não-governamentais.
Para a prática de concussão — constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, valendo-se da condição de funcionário público para tolerar ou deixar de fazer alguma coisa — o aumento do rigor é ainda maior. A pena prevista passa a ser reclusão de 5 a 12 anos. Hoje, pelo Código Penal, são 2 a 8 anos. Com informações da Agência Câmara.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

A celeuma dos juros


Taxas baixas não combinam com inflação em alta, mas taxas altas não casam com o crescimento do PIB. Conseguirá Tombini apontar a direção correta da política monetária?

Por Carla JIMENEZ
O Brasil mantém uma relação traumática com a inflação, e não é para menos. As décadas de hiperinflação deixaram cicatrizes, que provocam mal-estar até hoje, diante de qualquer indício de que os preços estejam saindo do controle. A memória das maquininhas de remarcações nos supermercados, ou dos salários que perdiam valor de um dia para o outro, são ainda vívidas no inconsciente coletivo brasileiro. Por isso, a divulgação do IPCA anualizado de 6,15%, há duas semanas trouxe o medo de que o Banco Central esteja perdendo a batalha para o dragão. “Teremos uma inflação menor em fevereiro por causa da redução do preço de energia”, diz Sergio Vale, economista da MB Associados, de São Paulo. 
 
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Alexandre Tombini, presidente do Banco Central: "Quando necessário,
a política monetária será adequadamente ajustada"
 
“Mas como será em fevereiro do ano que vem, quando não houver uma medida do gênero para compensar a alta de outros setores?” A ansiedade com o assunto ficou patente no mercado de juros futuros. Enquanto a taxa Selic está em 7,25%, os contratos com vencimento em janeiro de 2014 subiram a 7,44% no último dia 7, quando o IPCA foi divulgado. Na semana passada, já estavam em 7,75%. O governo garante que haverá um arrefecimento da alta de preços no curto prazo, o que levará a inflação de 2013 a um patamar inferior ao resultado do ano passado, de 5,75%. A tese é partilhada por especialistas como Heron do Carmo, professor da Universidade de São Paulo, para quem o IPCA fechará em 5,5% neste ano. 
 
No entanto, as mensagens da equipe econômica de que essa meta será perseguida a qualquer custo têm se mostrado insuficientes. “Nosso crescimento está sendo construído em cima da inflação sob controle, juros baixos e investimento”, afirmou a presidenta Dilma Rousseff, em discurso feito durante a festa realizada em São Paulo, na quarta-feira 20, para celebrar os dez anos do PT no poder. Embora essa espécie de mantra seja repetido tanto pela presidenta como pela sua equipe econômica, a pesquisa Focus da semana passada apontou para um IPCA de 5,70%, acima da expectativa do governo. 
 
Seja por uma preocupação legítima ou por uma leitura política enviesada, o fato é que o mercado passou a interpretar que o governo estaria deixando de lado a utilização dos juros como instrumento para reduzir o ímpeto inflacionário. As especulações fizeram o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mandar um recado da Rússia, no último dia 15, onde se reunia com autoridades econômicas dos países do G-20. “O juro não é fixo, e se a inflação for preocupante, o governo vai mexer”, disse Mantega. “Mas isso é com o Banco Central.” De fato, é o BC o responsável pela calibragem das taxas, e na visão dos mais céticos, o presidente Alexandre Tombini estaria demorando muito para tomar as rédeas da situação. 
 
“Se não aumentar agora os juros, vai ser mais difícil reduzir o índice para 4,5%, que é o centro da meta, mais adiante”, diz Vale. Para o professor da Universidade de São Paulo, Simão Silber, o governo está mais pautado pela agenda eleitoral, adiando remédios amargos, o que reduz a crença dos agentes. “Ganhar credibilidade é difícil, mas perdê-la é muito rápido”, afirma Silber. Enquanto isso, Tombini, considerado muito mais contido e econômico com as palavras do que seu antecessor no BC, Henrique Meirelles, vem administrando pacientemente seu papel de “vidraça”. A crítica mais recorrente é de que o BC perdeu a autonomia de outrora, e que estaria focando muito mais no crescimento do consumo do que na tarefa básica da autoridade monetária, que é controlar a inflação. 
 
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Esse tipo de reação dos agentes econômicos não é novidade para o titular do BC. Em 2011, Tombini foi submetido ao mesmo tipo de pressão, por razões opostas. Ele foi duramente criticado quando iniciou um ciclo de queda da Selic, em agosto daquele ano, após cinco altas consecutivas, para reduzir a atividade econômica, que vinha num embalo perigoso e poderia afetar os preços, depois do PIB de 7,5% de 2010. Ao longo do tempo, sua decisão mostrou-se acertada, pois a crise internacional reduziu o ritmo da economia naturalmente. Para o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Universidade de Campinas, a história se repete agora. “Não sei por que tanta celeuma em torno dessa questão”, diz Belluzzo. 
 
“Confio no Tombini, e quando houver necessidade de aumentar os juros, ele o fará, sem ficar à mercê das pressões externas.” Na terça-feira 19, Tombini aproveitou o discurso proferido durante uma solenidade do BC, para reforçar que “não existe hoje no País risco de descontrole da inflação”. Belluzzo admite que a chamada difusão de preços, ou seja, a parcela de itens monitorados pelo IPCA que estão em alta, já representa três quartos do índice, o que obrigará, certamente, o Comitê de Política Monetária (Copom) a aumentar o juro, provavelmente na reunião de abril – a próxima acontece nos dias 5 e 6 de março. “É uma calibragem natural, como aquele segredinho, o tempero especial para fazer um bom arroz”, diz Belluzzo. 
 
É exatamente essa difusão percebida pelos agentes econômicos que provocou o ajuste para cima das taxas futuras. “O mercado futuro já fez o trabalho sujo do BC”, ironiza Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor da instituição financeira. “Os financiamentos mais longos já estão mais caros, o que deve levar o Copom a aumentar as taxas para atenuar os temores de que os preços vão subir mais adiante.” Embora seja um paradoxo – aumentar a Selic agora, para reduzir as taxas de longo prazo –, Freitas avalia que esse é o melhor caminho para o BC afastar as incertezas que envenenam a confiança dos investidores. O ex-diretor do BC se refere aos investidores de papéis no mercado. Já os empresários, que produzem e negociam bens e serviços tangíveis, pensam exatamente ao contrário. 
 
“O desafio atual é ampliar oferta, e não contrair demanda”, afirma Flavio Castelo Branco, gerente-executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria. O economista Fabio Silveira, da RC Consultores, concorda. “Se o BC aumentar a Selic, ele inverte a expectativa, o que traria outro problema”, diz Silveira que, ao contrário da maioria, espera um corte de 0,25 ponto. O presidente do BC se encontraria, assim, diante de uma escolha de Sofia, dilema esse, de passagem, inerente a seu cargo. De qualquer forma, na semana passada Tombini aproveitou para enviar a seguinte mensagem: “Quando necessário, se ensejado pelo cenário prospectivo para a inflação, a postura do BC em relação à política monetária será adequadamente ajustada.” Seu discurso só ficará claro na próxima reunião do Copom. Por ora, suas palavras elevaram as taxas futuras.
 
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Juros mais baixos, lucros mais altos


As taxas de juro caíram para os menores níveis da história do País e, mesmo assim, os bancos públicos ganharam dinheiro como nunca. Conheça o segredo de BB e Caixa.

Por Cláudio GRADILONE
Quando o preço baixa, a freguesia compra mais. Os balanços de 2012 do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, divulgados na semana passada, mostram que esse velho princípio do varejo está mais atual do que nunca. Os dois bancos estatais divulgaram resultados recordes em 2012, ano em que o governo induziu a queda das taxas de juros para os menores níveis da história do País – a Selic, juro básico da economia, caiu de 12% para 7,25%. Nesse ambiente, o Banco do Brasil lucrou R$ 12,2 bilhões, com crescimento de 0,7% no ano. Já a Caixa obteve um lucro recorde de R$ 6,07 bilhões, com avanço de 17% em relação a 2011. 
 
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BBendin, do BB: 12,8 milhões de clientes passaram a usar os serviços do banco
 
“Os resultados de 2012 mostraram o acerto da nossa estratégia”, disse Jorge Hereda, presidente da Caixa, na quarta-feira 20. “O Banco do Brasil lucrou vendendo mais produtos para mais clientes”, afirmou, no dia seguinte, Aldemir Bendine, presidente do BB. O que chamou a atenção nos dois casos foi o forte avanço na concessão de crédito. No BB, a carteira de empréstimos chegou a R$ 580 bilhões, um crescimento de 24,9% em relação a 2011. Já o avanço da Caixa foi mais significativo. Os empréstimos aumentaram 42,8% e atingiram R$ 361 bilhões, sendo que a carteira imobiliária, a mais importante do banco, avançou 44% e, por pouco, não chegou a R$ 200 bilhões.
 
Ambas instituições estabeleceram metas ambiciosas para 2013. Neste ano, a Caixa projeta uma expansão de 35% na carteira de empréstimos, ao passo que os concorrentes privados de varejo calculam uma média de 15%. “Vamos chegar ao fim de 2013 anunciando um resultado tão bom quanto esse”, afirmou o presidente da Caixa. A meta de Bendine é ampliar a carteira do BB em até 20%. “O banco iniciou um processo de ampliação da rede de agências e de contratação de pessoal em 2011, e vamos colher mais frutos neste ano”, disse ele. A reação do mercado aos resultados foi positiva: as ações do Banco do Brasil avançaram 4,1% na quinta-feira 21, em um pregão onde as cotações de Itaú Unibanco e Bradesco recuaram. 
 
“O crescimento de 24,9% na carteira de crédito do BB foi bem superior aos 7% de média do mercado, e o banco conseguiu isso melhorando as margens financeiras e melhorando a qualidade dos ativos”, avalia Mario Pierry, analista-chefe do Deutsche Bank. Karina Freitas, da corretora Concórdia, também elogiou o desempenho. “O BB surpreendeu não só pelo bom crescimento das carteiras, mas também pelo aumento sólido nas receitas provenientes de seguros e de prestação de serviços.” Tanto Bendine quanto Hereda atribuíram o bom desempenho à estratégia de se anteciparem ao ajuste do mercado financeiro aos juros menores. As carteiras de empréstimos de ambos avançaram e a inadimplência recuou. 
 
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Hereda, da Caixa: resultado recorde em 2012, com R$ 200 bilhões
em crédito imobiliário
 
Segundo Bendine, as taxas menores estimularam clientes endividados a trocar seus financiamentos por créditos mais baratos, o que facilitou o pagamento das parcelas. Para ele, o mais surpreendente dos resultados de 2012 foi a ativação da base de clientes. O BB possui 55 milhões de correntistas, e é difícil trazer mais pessoas para esse universo. No entanto, afirmou, a redução dos juros e das tarifas e o maciço esforço publicitário fizeram com que 12,8 milhões de pessoas ampliassem sua atuação com o banco. “Desse total, 9,5 milhões passaram a usar pelo menos um produto, e 3,3 milhões tomaram seu primeiro financiamento”, disse. 
 
Pierry, do Deutsche, notou que os resultados do Banco Votorantim, uma notória fonte de prejuízos para o BB, estão melhorando. Bendine quer mais. “O Votorantim não vai dar prejuízo em 2013”, disse ele ao apresentar os resultados. Apesar de o BB ter injetado R$ 4,2 bilhões no Votorantim ao longo dos últimos quatro anos para sanear a carteira de financiamentos automotivos do banco, Bendine afirma que os resultados futuros serão positivos. Segundo ele, o banco possui uma estrutura muito bem azeitada para ampliar esses empréstimos, algo estratégico para o BB. 
 
Bendine não comentou as negociações para ampliar a participação acionária no Votorantim. Um dos trunfos do BB para 2013 são os financiamentos imobiliários, algo relativamente recente na história da instituição. Atualmente, a carteira desses empréstimos é de R$ 12,9 bilhões. A meta para o fim de 2012 é mais do que dobrar essa cifra, atingindo R$ 27 bilhões. “Temos um objetivo interno de sermos o segundo maior banco em empréstimos imobiliários até o fim deste ano”, disse Bendine. Outro coringa para ampliar os negócios é a expansão internacional. Além de transformar diversos escritórios na Europa e na Ásia em agências, o BB está negociando a compra de instituições nos Estados Unidos, nos estados da Flórida e de Nova Jersey. 
 
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Os ganhos do BTG Pactual

Lucro do banco de investimentos cresce 70% em relação a 2011
 
Os lucros não foram recordes apenas para os gigantes estatais de varejo. O banco de investimentos BTG Pactual, do banqueiro André Esteves, anunciou um ganho de R$ 3,2 bilhões no ano passado, alta de 69,4% em relação a 2011, apesar do prejuízo de R$ 603 milhões do PanAmericano, controlado pelo BTG em associação com a Caixa. A rentabilidade patrimonial do BTG foi de 28,7%. Segundo Nataniel Cezimbra, analista do BB Investimentos, esse número está bem acima da média de 16,4% registrada pelos bancos privados brasileiros. 
 
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Esteves: "Resultado mostra a Força do nosso modelo de negócios"
 
“O bom desempenho mostra a força do nosso modelo de negócios”, disse Esteves. O ritmo lento do mercado de capitais reduziu as emissões de ações e o saneamento do PanAmericano afetou o resultado, o que foi compensado pelo crescimento de 60% na carteira de empréstimos corporativos, que atingiu R$ 33,8 bilhões. Esteves avalia que o desempenho de 2013 será beneficiado pelo aquecimento do mercado de capitais. 

Os economistas


Resolvi juntar algumas linhas que escrevi a respeito dos economistas, suas teorias, convicções e previsões. No estouro da crise financeira, as maledicências sobre economistas, suas teorias, crenças e previsões corriam soltas, à velocidade da peste nos centros financeiros do mundo. Mas, passado o susto, os que fracassaram em suas antecipações já sobem o tom de suas arrogâncias e voltam a trovejar sua cambaleante sabedoria.
A reputação dos economistas e o prestígio de sua arte de antecipar tendências variam na mesma direção dos ciclos do velho, resistente, mas talvez nem tão surpreendente capitalismo. Quando os negócios vão bem, as previsões mais otimistas são ultrapassadas por resultados formidáveis. É a festança dos consultores: o noticiário da mídia não consegue oferecer espaço suficiente para os profetas e oráculos da prosperidade eterna. Na era da informação a coisa é ainda pior: em tempo real, os meios eletrônicos regurgitam uma fauna variada de palpiteiros e adivinhões. Todos ou ao menos a maioria tratam de insuflar a bolha de otimismo.
Quando desabou a tormenta, as certezas dos analistas mais certeiros entraram em colapso. Em pleno estado de oclusão mental diante da derrocada dos preços dos ativos e da violenta contração do crédito, um gênio da finança global proclamava na televisão: “Os investidores são racionais, mas estão em pânico”. Imaginei que antes da emboscada do subprime e de outros créditos alavancados, os investidores racionais estivessem apenas no exercício de sua peculiar racionalidade.
O pânico dos mercados induziu à pane na razão. O ineditismo dos acontecimentos abalroou seus modelos e fez naufragar suas previsões. Desconcertados, os sábios de ontem embarcam em hipóteses exóticas e peregrinas, como as que atribuem responsabilidade aos devedores Ninja (No income, no job, no asset), gente irresponsável que não deveria aceitar os empréstimos gentilmente oferecidos por bancos generosos. Ainda na quarta-feira 13, o republicano da Flórida, Marco Rubio, descarregou a culpa da crise no governo e nos políticos que estimularam os créditos predatórios.
Em sua crueldade, as maledicências maltratam a labuta persistente dos economistas acadêmicos, sempre dedicados à construção de teorias e modelos sofisticados (lembro que sofisticado vem de sophoi, cognato de sofista) que em vez de explicar como funcionam as engrenagens do capitalismo, cuidam zelosamente de falsificar seu modo de funcionamento.
O economista Willem Buiter desancou a revolução novo-clássica das expectativas racionais, associada aos nomes de Robert Lucas e Thomas Sargent, entre outros. A teoria econômica, diz ele, “tornou-se autorreferencial… impulsionada por uma lógica interna e por quebra-cabeças estéticos, em vez de motivada pelo desejo de compreender como a economia funciona… Assim, os economistas profissionais estavam despreparados quando a crise eclodiu”.
Nos idos de 2009 relatei aos leitores de CartaCapital uma proeza de Robert Lucas que  exibe em suas prateleiras acadêmicas o Prêmio Nobel. Em setembro de 2007, Lucas publicou noWall Street Journal o artigo “Hipotecas e Política Monetária” (“Mortgage and Monetary Policy”). Àquela altura do campeonato, o preço das residências despencava com grande estrondo. Até mesmo os mais fanáticos crentes na  eficiência dos mercados estariam incomodados com o barulho, para não falar da pulga que percorria insistemente a parte posterior de suas respeitáveis orelhas. Suspeito que Lucas tenha baixa sensibilidade nesta região do corpo humano. Mas ele não é apenas um crente, é um sacerdote. 
Escreveu no Journal: “Sou cético a respeito do argumento que sustenta haver risco de contaminação de todo o mercado de hipotecas pelos problemas surgidos na faixa subprime. Tampouco acredito que a construção residencial possa ser paralisada e que a economia vá deslizar para uma recessão. Cada passo nessa cadeia de argumentação é questionável e nada foi quantificado. Se aprendemos alguma coisa da experiência dos últimos 20 anos é que há muita estabilidade embutida na economia real”.
As recomendações e análises dos economistas (inclusive as minhas), mesmo quando prestadas em boa fé, estão eivadas de valorações e pressupostos não revelados, para não falar de ostentações de rigor e cientificidade incompatíveis com a natureza do objeto investigado. Esse incidente, o desacordo entre o método de investigação e a natureza do objeto investigado, é quase sempre ignorado pelos praticantes da Ciência Triste. Isso não lança necessariamente dúvida sobre a honestidade intelectual dos economistas, mas os obriga a explicitar as “visões” (como dizia Schumpeter) que antecedem e fundamentam suas análises. Essas cautelas tornam-se ainda mais imperiosas quando as sabedorias dos interesses subjugam os interesses pelo conhecimento.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Empresa diz que Anatel negociou decisões

Dono da Unicel protocola na Procuradoria acusação de que suposto cartel garantia pareceres da agência
Teles e conselheiros não comentaram; órgão regulador diz que afirmações da operadora são infundadas
JULIO WIZIACK
DIÓGENES CAMPANHA
DE SÃO PAULO
ANDREZA MATAIS
DE BRASÍLIA
A operadora de telefonia celular Unicel apresentou ao Ministério Público Federal acusações contra um suposto cartel das teles, que negociaria pareceres, votos e até decisões do conselho diretor da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações).
No documento, protocolado no dia 4 de fevereiro, sob o número 2.122/2013, o controlador da Unicel, José Roberto Melo da Silva, acusa as quatro maiores teles do país -Vivo, Oi, Claro e TIM- de impedir a entrada de novos competidores, "fazendo acertos" com os reguladores.
No final do ano passado, a Anatel extinguiu a outorga da Unicel, impedindo, dessa forma, sua venda para a Nextel.
Melo da Silva afirma ter testemunhas do esquema e diz que entregou ao MPF documentos que comprovam as acusações. Dentre eles, diz, estão decisões da agência que tratam casos de extinção da outorga, como o da Unicel, com resultado diferente.
Procurados pela reportagem, os profissionais citados na acusação não quiseram dar declarações. A Anatel negou "veementemente" o que chamou de "acusações vazias". O sindicato das operadoras não quis dar entrevista.
SUPOSTO ESQUEMA
Melo da Silva acusa o conselheiro Jarbas Valente de ser o líder do suposto esquema. "Ele negocia com o cartel", disse à reportagem.
Segundo o dono da Unicel, quando um assunto de interesse de uma operadora chegava à agência para ser avaliado, alguns superintendentes já acertavam seus pareceres técnicos de acordo com interesses do suposto cartel.
Depois disso, afirma Melo da Silva, o procurador-geral da Anatel, Vitor Cravo, dava parecer jurídico favorável às empresas de telefonia.
Dados esses pareceres, os processos seguem para a votação do conselho. Para influenciar essa decisão, "os pareceres 'vazavam' na imprensa como fato consumado", diz o dono da Unicel.
Segundo Melo da Silva, como hoje há um sorteio dos processos entre os conselheiros da agência, "Jarbas Valente articula as decisões e pressiona o relator". "Sitiado, o conselho aprova a 'análise consensual' ", afirma
Ainda segundo a Unicel, Sávio Pinheiro, dono da SP Communication, era o braço financeiro do esquema.
A contratação da empresa era recomendada a operadoras por funcionários da Anatel. A compensação financeira justificaria "caros apartamentos em Brasília, carros luxuosos, filhos estudando no exterior", afirma Melo da Silva. Ele não apresentou à Folha comprovantes dos pagamentos.
TV PAGA
Segundo o empresário, o suposto esquema da SP Communication foi usado para permitir que a TVA, então controlada pelo Grupo Abril, vendesse banda larga.
A decisão foi aprovada em 2006 e, no mesmo ano, a TVA recebeu um aporte de US$ 442 milhões de um grupo sul-africano. Na sequência, foi vendida à Telefônica por cerca de US$ 1 bilhão.
Sávio Pinheiro confirma que a TVA era sua cliente até ser vendida, mas diz que, "neste caso específico", não atuou diretamente. "A Abril não se envolveu através de mim", afirmou.
Melo da Silva, no entanto, afirma ter testemunhas da intervenção. O Grupo Abril não quis comentar o assunto.
Segundo o dono da Unicel, o primeiro relatório favorecendo a TVA foi feito por José Pereira Leite, cotado para presidir a agência. Leite mantinha em seu gabinete Alexandre Pinheiro, filho de Sávio, da SP Communication.
O ex-conselheiro da Anatel diz que Alexandre era estagiário e que não beneficiou o Grupo Abril. "Seguimos uma recomendação da União Internacional de Telecomunicações", argumenta.
Papéis comprovando a intervenção de Leite, diz o empresário, foram entregues ao presidente Lula no dia em que seria publicada a nomeação de presidente da Anatel.
A nomeação não saiu e Leite deixou a agência em 2007.

Ex-ministra Erenice era ligada a empresa
No final do ano passado, a Anatel extinguiu a outorga da Unicel, impedindo, dessa forma, sua venda para a Nextel.
A transação permitiria que José Roberto Melo da Silva, controlador da Unicel, se livrasse das dívidas acumuladas pela operadora, e daria à Nextel tamanho para concorrer com as grandes operadoras em melhores condições.
O episódio começou em 2005, quando Melo da Silva participou de uma licitação para obter frequências de celular. Como depositou apenas 1% em garantias -a exigência era de 10%-, a Anatel barrou a pretensão.
Em 2007, a Justiça concedeu à Unicel o direito de complementar a garantia. Ela depositou a diferença, mas a agência demorou a abrir a proposta da empresa.
Melo da Silva, então, escreveu uma carta para Erenice Guerra -ex-ministra da Casa Civil que deixou o cargo em 2010, sob acusação de favorecimento a empresas, incluindo a operadora.
Um dia após a carta, a Casa Civil interferiu na Anatel, a proposta foi aberta e a Unicel obteve licenças para operar em 13 municípios de São Paulo. A ingerência causou "mal-estar em pessoas sérias" da agência, disse um ex-conselheiro à Folha.
Melo da Silva nega ter sido beneficiado pela ex-ministra. "Se tivesse, a situação seria positiva. Tenho uma dívida de R$ 600 milhões e extinguiram minhas licenças."
Ele afirma que a ligação com Erenice é pessoal: é amigo de José Roberto Campos, marido da ex-ministra. Ele e sua mulher foram padrinhos de casamento do casal.
Em 2008, de posse das licenças, a Unicel lançou a Aeiou, três anos depois de sua oferta inicial. Pouco depois, seu sócio estrangeiro tentou assumir o controle e, derrotado, deixou a empresa.
Sem dinheiro, a operação parou em meados de 2010.
A Unicel começou então a negociar sua venda para a Nextel, que, em 2012, informou à Anatel que assumiria as dívidas, se incorporasse as frequências da Unicel. Isso lhe daria 55 MHz e força para poder atingir 4% de mercado.
A Unicel, porém, foi extinta no dia em que a proposta da Nextel seria apreciada pela agência reguladora.
(JW, AM E DC)

OUTRO LADO
Agência afirma que processará empresário

A Anatel nega veementemente as acusações de José Roberto Melo da Silva, dono da operadora Unicel. Por meio de sua assessoria, a agência diz que irá solicitar ao Ministério Público Federal (MPF) que ele seja processado por calúnia.
"O empresário faz 'denúncias vazias' desde 2007 e, agora, volta à prática na tentativa de se mostrar vítima de perseguição", diz a agência.
Sobre a extinção da outorga da Unicel, a nota afirma: "Ela obteve sua outorga com liminares que, posteriormente, perderam a eficácia."
Por isso, afirma, o conselho extinguiu a autorização antes de decidir o pedido de compra da Unicel pela Nextel, negado no mesmo dia.
ABSURDO
O ex-conselheiro da Anatel José Leite Pereira Filho negou ter beneficiado o Grupo Abril. "Seguimos uma recomendação da UIT [União Internacional de Telecomunicações], que sugeria que a frequência [da TV paga] também fosse destinada ao tráfego de dados [internet]."
Leite disse que não procede a informação sobre sua nomeação à presidência da Anatel. José Crispiano, assessor de Lula, afirmou que não cabe ao ex-presidente comentar indicações não feitas.
Sávio Pinheiro, dono da SP Communication, classificou a acusação da Unicel como "uma coisa absurda" e disse que nunca pagou propina na Anatel, mas não pretende recorrer à Justiça.
Pinheiro afirma que sua consultoria atua há 15 anos e atende "quase todas as operadoras" desde então. "Ajudo na hora de um conflito entre elas e o governo", diz.
Afirma que também é procurado pela agência por seu conhecimento do setor e negou que diretores da Anatel frequentem a sua empresa.
O Sinditelebrasil, que representa as operadoras, e o Grupo Abril não quiseram comentar.
(JW, AM e DC)
 
Fonte: Folha de S.Paulo

Mercado de capitais para microempresas

Por Flavio Augusto Picchi
Em abril de 2012 ocorreu a aprovação do "Jumpstar Our Business Startups Act" (JOBS Act), lei americana cuja finalidade principal foi estimular o financiamento de micro e pequenas empresas (MPEs) por meio do mercado de capitais, o denominado "equity crowdfunding". Crowdfunding é a denominação do processo de captação de recursos para financiamento de projetos diversos, normalmente por meio de plataformas digitais. O marco regulatório ali ainda não está completo, pois falta à SEC, equivalente da nossa Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a edição de diversos dispositivos.
Sem entrar em profundas análises sobre o ambiente americano, o fato é que os termos do Jobs Act vêm despertando críticas de interessados, pois a pretendida simplificação e incremento do acesso das MPEs ao mercado parece ser complexa e limitada. Ainda assim, o acontecimento já desperta interesse no Brasil, ensejando discussões e oportunidades para que MPEs nacionais façam uso de instrumentos semelhantes. E Pode parecer curioso que o regime legal para emissão de valores mobiliários por MPEs no Brasil seja apontado como paradigmático.
Grande parte dessa conclusão deve-se à posição inovadora que a CVM teve na questão, fruto dos comandos constitucionais e legais que informam as políticas públicas nacionais em relação às MPEs. Com a edição da Lei Complementar nº 123 em 2006, foram assentadas as bases necessárias, atendendo à determinação contida desde 1988 no art. 179 da Constituição. Comprometida em atender àquelas políticas, simplificando o acesso ao mercado de capitais, a CVM passou a editar Instruções para alcançar esses objetivos. Em especial, podem ser citadas as Instruções CVM de números 473, de 2008, 476, de 2009, 480, de 2009 e 482, de 2010.
Soluções criativas podem ser adotadas para viabilizar esse tipo de financiamento
A dispensa automática de registro para emissões de MPEs foi adotada na Instrução CVM nº 480, de 2009, a partir de sugestão formulada pela própria Superintendência de Registro de Valores Mobiliários da CVM, no contexto da Audiência Pública nº 07, de 2008 - que colheu sugestões para sua redação final. Com relação à Instrução CVM nº 482, de 2010, a própria autarquia, no relatório da audiência pública nº 01, de 2009, reforçou seu compromisso em assegurar tratamento diferenciado às MPEs, mantendo "a dispensa de registro de emissão e de submissão a um regime informacional mínimo", medida suficiente para "garantir a supervisão e transparência em ofertas de emissores de micro e pequeno porte".
Assegurada a dispensa de registro de emissão, conforme o art. 7º da Instrução CVM nº 480/09, basta o cumprimento das exigências estipuladas pelo art. 5º e pelo Anexo IX da Instrução CVM nº 400/03 (na redação conferida pela Instrução nº 482/10). Também devido a esse regime privilegiado, as obrigações correlatas aos demais emissores são dispensadas, como o formulário de referência e o de informações trimestrais.
Duas principais dúvidas que poderiam ter lugar são solucionadas segundo os termos do referido Anexo IX da Instrução CVM 400. Não há necessidade de instituições intermediárias no processo de oferta pública (conforme permitido pela Lei nº 6.385, de 1976), assim como não se exige que a emissora seja constituída como sociedade anônima. Essa possibilidade está em linha com a própria definição legal de MPEs - que exclui do conceito, entre outros casos, empresas constituídas sob essa forma societária.
Já é possível perceber que as regras de captação de recursos por MPEs brasileiras mediante emissão de valores mobiliários é surpreendentemente simples mas, disponível desde 2010, ainda é mecanismo inédito, até onde se sabe. A CVM possibilitou a captação de recursos para MPEs via equity crowdfunding, antes mesmo que esse novo conceito fosse formulado. Num país em que se alega que o mercado de capitais é pouco desenvolvido, é notável a adoção de soluções práticas e adequadas, a compor um marco regulatório exemplar a outras nações, mesmo mais desenvolvidas.
Na prática, soluções criativas podem ser adotadas para dar viabilidade esse tipo de financiamento. Títulos de dívida, como notas comerciais, podem ser lançadas por emissoras constituídas como sociedades limitadas (tal como prevê o art. 33 da Instrução CVM 400), em substituição às debêntures, cuja emissão é restrita a sociedades anônimas. Títulos de investimento coletivo podem ser emitidos garantindo participação em lucros ou com lastro em quotas de sociedades limitadas, com nomeação de um agente fiduciário. São apenas alguns primeiros exemplos para esboçar possibilidades.
A experiência efetiva dessas emissões dirá se os caminhos regulatórios são eficazes, ou se aprimoramentos são possíveis. E, mais importante, poderá proporcionar subsídios para fomentar o debate sobre meios de diminuir as barreiras ao investimento em startups, empresas inovadoras e de alto potencial. A discussão não pode deixar de levar em conta eventuais alterações na legislação tributária para incluir, em especial, incentivos e diferimentos fiscais, como já vem defendendo o Programa de Aceleração do Crescimento para Pequenas e Médias Empresas (PAC-PME).
Flavio Augusto Picchi é advogado especialista em direito societário, bacharel e mestre em direito internacional pela Universidade de São Paulo
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
 
Fonte: Valor Econômico

Rumo ao fim do jeitinho brasileiro

Quase 26 milhões de brasileiros se preparam para acertar as contas com o Leão nos próximos dias. A cada ano, a Receita Federal contabiliza o crescimento de contribuintes obrigados a recolher Imposto de Renda, condição justificada pelo fisco por conta do aumento do emprego e da renda do brasileiro. Por trás disso está também a maior formalização das atividades econômicas. Mas, é no uso da tecnologia da informação que se dá a maior transformação do sistema tributário brasileiro.

Esta deve ser a última vez que os contribuintes deverão preencher o formulário para a realização da declaração simplificada. No ano que vem, o próprio sistema já deverá preencher dados como o salário recebido das empresas, uma vez que essas informações são repassadas pelos empregadores ao fisco. O contribuinte que faz esse tipo de acerto com o Leão terá apenas que verificar se tudo está correto e finalizar o processo.

Esse é apenas um passo rumo ao controle cada vez maior das operações financeiras dos contribuintes. O uso crescente dos meios eletrônicos de pagamento facilita muito tudo isso. Hoje a Receita já é informada de transações eletrônicas até um determinado limite. Ou seja, se quiser, o fisco pode cruzar os dados e verificar se a renda declarada no IR é compatível com o padrão de despesas do contribuinte. Claro que, para isso ocorrer, exige-se uma mudança na legislação e no esforço de fiscalização, mas, tecnicamente, já é possível realizar o cruzamento de dados, como é feito com as despesas de saúde e de educação ou com os ganhos declarados.

Para as empresas, o cenário também é de mudança em razão da digitalização. Nota fiscal eletrônica, substituição tributária e escrituração eletrônica (Sped) são mecanismos que facilitam e tornam online o processo de fiscalização. Ainda em implantação e sujeitos a muitos ajustes, esses mecanismos promovem uma alteração substancial na maneira como as empresas se relacionam com o fisco. 

Para as pessoas jurídicas, por exemplo, a relação com os meios eletrônicos de pagamento é ainda mais reveladora, já que as operadoras de cartão de crédito informam para a Receita quanto cada CNPJ recebeu dos clientes no mês. A Receita também anunciou que vai cruzar as informações da Declaração de Débitos da Pessoa Jurídica (DCTF) com outras bases de dados do governo que poderiam revelar a posse de bens não declarados ao fisco. O sistema faz consultas a registros de veículos, embarcações e imóveis, por exemplo.

Aos poucos, vai se fechando o cerco, e a sonegação tributária se torna cada vez mais difícil. Dessa maneira, evoluímos para a condição de um país com maior justiça fiscal e equidade. O desafio da sociedade está em fazer com que o consequente aumento da arrecadação possa permitir uma redução da elevada carga de impostos, taxas e contribuições que incidem sobre todos. Além disso, dá mais voz à cobrança da correta aplicação dos recursos, fazendo com que os tributos cumpram sua razão efetiva de existir: garantir o serviço público básico a todos.

O pagamento do ISSQN fixo para as empresas de contabilidade, optantes do simples nacional

1 - Introdução
Como já mencionei, em alguns de meus artigos, a minha atividade atual na Prefeitura do Jaboatão dos Guararapes, onde tenho o cargo de Auditor Fiscal Tributário, com 17 (dezessete) anos completados no dia 16 de outubro de 2012, é a de Julgador Tributário da Primeira Instância Fiscal Administrativa, exercida no Núcleo de Instrução e Julgamentos da Secretaria da Fazenda, Gestão e Previdência. Nessa condição, tenho também a função de elaborar pareceres jurídicos, solicitados pelos diversos departamentos da Secretaria.
Pois bem, um de meus pareceres, proferido há alguns dias, versou acerca de uma dúvida apresentada por um dos meus colegas auditores, o qual tem como atividade atual a de fiscalizar os contribuintes do imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISSQN, e uma das empresas em que o meu colega estava procedendo com a fiscalização era um escritório de contabilidade.
Os trabalhos desenvolvidos pelo colega lhe geraram uma grande dúvida, o que culminou em um questionado formal ao Núcleo de Instrução e Julgamento. Sua pergunta era sobre a cobrança do ISSQN, incidente sobre a prestação do serviço de contabilidade, atividade constante do subitem 17.19 da Lista de Serviços anexa àLei Complementar Federal nº 116, de 31 de julho de 2003- LC nº 116/03.
A dúvida apresentada tinha relação com o valor que os escritórios de contabilidade deveriam recolher, sendo eles optantes do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples Nacional, instituído por meio doart. 12 da Lei Complementar Federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006- LC nº 123/06, mas que tenham auferido receita bruta, no ano calendário anterior, de até R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), já que, de acordo com este diploma legal, aquelas empresas, optantes do Simples Nacional, estariam no rol de entidades que pagariam o imposto por valores fixos mensais.
Alguns dias após ter respondido sobre o questionamento formulado pelo meu colega, um contribuinte, sendo este uma empresa prestadora de serviços contábeis, entrou com pedido formal de consulta fiscal, tendo apresentado, em linhas gerais, o mesmo tema do questionamento formulado pelo meu colega auditor, ou seja, como deveria proceder, em relação ao pagamento do ISSQN, haja vista o que dispunha aLC nº 123/06, em especial, oart. 18, § 22-A, que previa o pagamento do imposto por meio de valores fixos mensais.
Ora, logo se percebe a grande importância desse assunto, pois não são apenas os escritórios contábeis que pagarão o ISSQN(01) de forma fixa. Na verdade, segundo o que dispõe o chamado Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, diversas são as atividades que estarão aptas ao pagamento do imposto, em valores fixos, desde que, como veremos, seja do interesse dos municípios.
Entretanto, optei, neste trabalho, por focar os escritórios de contabilidade, e por dois motivos muito simples:
Primeiro: por ser uma atividade que entendo ser imprescindível na atual conjuntura econômica de nosso país. Em verdade, sempre o foi, haja vista a grande quantidade de normas tributarias espalhadas pelo nosso país-continente (02); e
Segundo: como veremos adiante, os escritórios de contabilidade, em relação ao pagamento do imposto de forma fixa, é uma exceção das exceções, pois terão um tratamento diferente das demais empresas prestadoras de serviços, já que, em meu entendimento, deverão efetuar o pagamento do imposto devido, de forma fixa, independentemente da vontade dos municípios, ao contrário das demais atividades autorizadas.
2 - Aspectos gerais acerca do tema
Como já mencionado, a dúvida apresentada pelo contribuinte e pelo meu colega auditor tinha relação com a determinação do valor do ISSQN, incidente sobre as atividades de prestação de serviços de contabilidade, tendo em vista o que determina aLC nº 123/06, no parágrafo 22-A doart. 18, ou seja, o pagamento do imposto ser efetuado, a partir de regulamentação municipal, em valores fixos mensais.
Muito bem, segundo o dispositivo acima citado, as empresas de prestação de serviços contábeis irão efetuar o pagamento do imposto sobre serviços em valores fixos mensais, de acordo com a competente legislação municipal. É como podemos visualizar a seguir:
"Art. 18. (...)
(...)
§ 22-A A atividade constante do inciso XIV do § 5º-B deste artigo recolherá o ISS em valor fixo, na forma da legislação municipal".
Entretanto, para um melhor entendimento deste assunto, é necessário um estudo mais abrangente, ou seja, tomando por base a análise de outros dispositivos daquela lei complementar, a partir do que determina o seuartigo 12:
"LC nº 123/06
Art. 12. Fica instituído o Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidas pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples Nacional".
Com isso, o legislador complementar implementou o que previa aConstituição Federal de 1988- CF/88, no seuart. 146, III, "d":
"CF/88
Art. 146. Cabe à lei complementar:
(...)
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
(...)
d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239".
Assim, incluso naLC nº 123/06, que estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido àqueles empreendimentos, relativamente à apuração e recolhimento de tributos da competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, das obrigações trabalhistas e previdenciárias e do acesso ao crédito e ao mercado, temos todo o arcabouço tributário, previsto para as pequenas empresas brasileiras.
O leque de tributos que estão abrangidos pelo Simples Nacional está exaustivamente previsto noart. 13, onde, no caso em concreto, temos o ISSQN:
"Art. 13. O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
(...)
VIII - Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS".
Entretanto, o legislador complementar excetuou algumas atividades, cujas empresas prestadoras dos serviços não poderiam optar por aquele regime simplificado de apuração e pagamento de tributos. Assim, noart. 17, temos, de forma exaustiva, as atividades cujas empresas estarão impedidas de exercer aquela opção e, dentre elas, as de profissões regulamentadas:
"Art. 17. Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte:
(...)
XI - que tenha por finalidade a prestação de serviços decorrentes do exercício de atividade intelectual, de natureza técnica, científica, desportiva, artística ou cultural, que constitua profissão regulamentada ou não, bem como a que preste serviços de instrutor, de corretor, de despachante ou de qualquer tipo de intermediação de negócios". (grifei)
Portanto, noartigo 17 da LC nº 123/06identificamos, de pronto, as atividades, cujas empresas que as exercem, estão excluídas da possibilidade de optar pelo pagamento dos tributos federais, estaduais e municipais, por meio do Simples Nacional, dentre as quais, no inciso XI, a de profissão regulamentada, na qual se incluem as entidades que prestam serviços contábeis.
Entretanto, com aLei Complementar nº 128, de 19 de dezembro de 2008- LC nº 128/08, cuidou o legislador complementar de excepcionar algumas daquelas atividades previstas noartigo 17, conforme podemos observar a partir do novo texto normativo do parágrafo 1º deste artigo:
"Art. 17. (...)
(...)
§ 1º As vedações relativas ao exercício das atividades previstas no caput deste artigo não se aplicam às pessoas jurídicas que se dediquem exclusivamente às atividades referidas nos §§ 5º-B a 5º-E do art. 18 desta Lei Complementar, ou as exerçam em conjunto com outras atividades que não tenham sido objeto de vedação no caput deste artigo".
A partir doart. 18 da LC nº 123/06, temos o disciplinamento do quantum a ser pago pelas empresas optantes do Simples Nacional e nos seus parágrafos 5º-B ao 5º-E, as atividades, cujas empresas prestadoras daqueles serviços estarão excluídas da proibição prevista no caput doart. 17, a exemplo das empresas prestadoras de serviços contábeis:
"Art. 18. O valor devido mensalmente pela microempresa e empresa de pequeno porte comercial, optante pelo Simples Nacional, será determinado mediante a aplicação da Tabela do Anexo I desta Lei Complementar.
(...)
§ 5º-B Sem prejuízo do disposto no § 1ª do art. 17 desta Lei Complementar, serão tributadas na forma do Anexo III desta Lei Complementar as seguintes atividades de prestação de serviços:
(...)
XIV - escritórios de serviços contábeis, observado o disposto nos §§ 22-B e 22-C deste artigo"; (grifei)
Desta forma, ficam determinadas, dentre várias outras, as empresas prestadoras dos serviços contábeis, como exceção à regra geral de exclusão do Simples Nacional, ou seja, daquelas empresas proibidas da possibilidade do exercício da opção pelo pagamento dos tributos incidentes sobre a receita bruta mensal, por meio do daquele sistema simplificado de pagamento de tributos.
Entretanto, mais adiante, no mesmoartigo 18, tem-se a possibilidade de um segundo benefício para as empresas prestadoras de serviços, optantes do Simples Nacional, em específico, no parágrafo 18, a ser concedido pelos Municípios, ou seja, a previsão de que o ISSQN seja pago por meio de valores fixos mensais:
Art. 18. (...)
(...)
§ 18. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito de suas respectivas competências, poderão estabelecer, na forma definida pelo Comitê Gestor, independentemente da receita bruta recebida no mês pelo contribuinte, valores fixos mensais para o recolhimento do ICMS e do ISS devido por microempresa que aufira receita bruta, no ano-calendário anterior, de até R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), ficando a microempresa sujeita a esses valores durante todo o ano-calendário. (grifei)
Portanto, o benefício não será para todas as empresas, já que a permissão para o pagamento do ISSQN, por valores fixos mensais, caso seja do interesse dos Municípios, somente será concreta para aquelas que tenham auferido, no ano-calendário anterior, receita bruta total limitada a R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) e, portanto excluindo, na prática, as empresas de pequeno porte, já que, para estando nesta condição, obtêm receitas com valores a partir de R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) anuais.
Neste sentido, o Comitê Gestor do Simples Nacional - CGSN, por meio daResolução CGSN nº 94, de 29 de novembro de 2011- Res. CGSN nº 94/11, em seuartigo 33, regulamenta aLC nº 123/06, estabelecendo, entretanto, o limite máximo de R$ 100,00 (cem reais) mensais, no seu parágrafo segundo, inciso segundo, para pagamento do ISSQN, tendo em vista o que determina o parágrafo dezenove doart. 18 da LC nº 123/06,verbis:
"Art. 18. (...)
(...)
§ 19. Os valores estabelecidos no § 18 deste artigo não poderão exceder a 50% (cinquenta por cento) do maior recolhimento possível do tributo para a faixa de enquadramento prevista na tabela do caput deste artigo, respeitados os acréscimos decorrentes do tipo de atividade da empresa estabelecidos no § 5º deste artigo".
Ocorre que, se tomarmos por base o valor máximo de receitas que a empresa prestadora de serviços poderia auferir, para a manutenção do benefício descrito no parágrafo dezoito doart. 18, ou seja, de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) por ano, teríamos um valor mensal de receita de serviços de até R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Calculando o ISSQN, utilizando a alíquota correspondente à receita dos últimos 12 (doze) meses, anteriores ao do pagamento do imposto, a partir da tabela do Anexo III daLC nº 123/06, que prevê a alíquota a ser utilizada, no percentual de 2% (dois por cento), teríamos o valor máximo de ISSQN equivalente a R$ 200,00 (duzentos reais).
Entretanto, como há o limite imposto pelo parágrafo dezenove doart. 18 da LC nº 123/06, no percentual máximo de 50% (cinquenta por cento) do maior recolhimento possível, para a faixa de receita de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), o valor a ser pago, a título de ISSQN, pela microempresa estará limitado a R$ 100,00 (cem reais).
No entanto, para essa sistemática de apuração do imposto, cuidou o legislador complementar de estabelecer o que entendo como sendo uma exceção da exceção, ou seja, as empresas prestadoras de serviços contábeis, como podemos verificar na leitura do parágrafo 22-A do mesmoartigo 18:
"Art. 18. (...)
(...)
§ 22-A. A atividade constante do inciso XIV do § 5º-B deste artigo recolherá o ISS em valor fixo, na forma da legislação municipal".
Ora, o parágrafo 18 é regra geral. Trás para sua normatização, todo um conjunto de empresas de prestação de serviços que, independentemente dos valores auferidos de receita bruta, em cada mês-calendário, tendo auferido um volume total de receitas, em valor igual ou inferior a R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), no ano-calendário anterior ao de apuração, e sendo do interesse do município, irá pagar o ISSQN com base em valores fixos mensais, observado o limite descrito no parágrafo 19 doart. 18.
Assim, o que se tem no parágrafo 18 doart. 18 da LC nº 123/06é uma relação direta entre a norma a ser editada pelo Município e a do próprio Comitê Gestor do Simples Nacional, já que consta, expressamente, que este Comitê iria regulamentar o referido dispositivo (03), para fins de que o benefício de pagamento do ISSQN, por valores fixos mensais, obedecendo-se os limites previstos no parágrafo 19 doart. 18, seja gozado pelas microempresas prestadoras de serviços, descritas nos parágrafos 5º-B ao 5º-E do art. 18 da Lei Geral e, repetindo, desde que haja interesse do município.
Entretanto, com o parágrafo 22-A doart. 18, restou claro que o legislador complementar deixou, EXCLUSIVAMENTE, para os Municípios, a possibilidade de legislar sobre a forma como APENAS OS ESCRITÓRIOS DE SERVIÇOS CONTÁBEIS, independentemente de estarem na condição de microempresas, ou de empresas de pequeno porte, irão efetuar o pagamento do imposto correspondente, na forma de valores fixos mensais.
3 - Conclusões
Por toda a leitura, bem como a respectiva interpretação que se pode fazer daLC nº 123/06, posso chegar às seguintes conclusões:
3.1 - Primeira
Todas as microempresas, prestadoras de serviços, optantes do Simples Nacional, que tenham auferido, no ano calendário anterior, receita bruta, igual ou inferior a R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais) e, CASO SEJA DO INTERESSE DOS MUNICÍPIOS, irão efetuar o pagamento do ISSQN, por meio de valores fixos mensais, limitando-se ao valor previsto noart. 18, § 19, II da LC nº 123/06e expressamente previsto noart. 33, § 2º, II da Res. CGSN nº 94/2011, isto é, R$ 100,00 (cem reais) mensais.
Obviamente, tenho como convicção que, neste caso em particular, caberá ao município estabelecer, quando da regulação doart. 18, § 18 da LC nº 123/06, o direito de opção às empresas, isto é, se estas querem, ou não, realizar o pagamento do imposto, por meio de valores fixos mensais. É exatamente o que posso identificar, a partir da leitura do caput do parágrafo 18 doart. 18:
"§ 18. Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no âmbito de suas respectivas competências, poderão estabelecer, na forma definida pelo Comitê Gestor..."
3.2 - Segunda
TODAS AS MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE QUE PRESTEM SERVIÇOS DE CONTABILIDADE, caso optantes do Simples Nacional, independentemente dos valores de receita bruta que auferirem mensalmente e dos valores de receita bruta, auferidos no ano-calendário anterior, DEVERÃO, nos termos da legislação municipal, efetuar o pagamento do ISSQN em valores fixos mensais.
"Sim, utilizo a expressão "DEVERÃO", pois é o que extraio da leitura do art. 18, § 22-A:
Art. 18. (...)
(...)
§ 22-A. A atividade constante do inciso XIV do § 5º-B deste artigo recolherá o ISS em valor fixo, na forma da legislação municipal". (grifei)
Ora, o verbo está no MODO IMPERATIVO. Por isso, entendo que o legislador complementar não deu aos Municípios, neste parágrafo 22-A, ao contrário do que temos no parágrafo 18, ambos doart. 18 da LC nº 123/06, a opção para instituir, caso seja do seu interesse, o benefício para pagamento do imposto sobre serviços de forma fixa, às demais empresas, cujas atividades são enumeradas nos §§ 5º-B ao 5º-E doart. 18, de acordo com sua regulamentação.
E mais, noart. 18, § 18, como temos a condição de que os prestadores de serviços, para serem beneficiados com a possibilidade do pagamento do ISSQN, por meio de valores fixos, não podem auferir receita bruta, em valor superior a R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), no ano-calendário anterior, entendo que ficam excluídas, automaticamente, as empresas de pequeno porte e, como no teor do parágrafo 22-A não temos tal observação, concluo que, para a empresa de prestação de serviços contábeis, estando na condição de empresa de pequeno porte, também caberá a obrigatoriedade de pagamento do imposto, por meio de valores fixos mensais.
3.3 - Terceira
Independentemente dos valores de receita bruta, auferidos mensalmente, as empresas de prestação de serviços contábeis, optantes do Simples Nacional, ainda que na condição de microempresas, nos termos doart. 3º da LC nº 123/06, NÃO FARÃO JUS AO BENEFÍCIO PREVISTO NO § 19 DOART. 18 DA LC Nº 123/06, isto é, de pagamento de, no máximo, 50% (cinquenta por cento) do maior recolhimento possível do tributo, para a faixa correspondente à receita de serviços, dos últimos 12 (doze) meses anteriores ao do mês de pagamento que, nos termos do que dispõe oart. 33, § 2º, II da Res. CGSN nº 94/2011, corresponde a R$ 100,00 (cem reais) mensais.
Ora, o parágrafo dezenove, em uma leitura sistemática de todas as normas pertinentes a esse assunto, impõe limites aos valores que serão apurados pela empresa, para pagamento do ISSQN, pelo que está previsto no parágrafo 18 doart. 18. Como o meu entendimento é de que as normas do parágrafo 22-A correm em paralelo as normas do parágrafo 18, não há lógica jurídica para que o limite estabelecido no art. 18, § 19 seja estendido às empresas prestadoras de serviços contábeis, optantes do Simples Nacional, que estarão reguladas, no que diz respeito ao pagamento do ISSQN, em valores fixos, peloart. 18, § 22-A da LC nº 123/06.
3.4 - Quarta
Caso o município não tenha legislado acerca do que dispõe o § 22-A doart. 18 da LC nº 123/06, as empresas prestadoras de serviços contábeis, optantes do Simples Nacional, NÃO TÊM COMO EFETUAR O PAGAMENTO DOS VALORES DO ISSQN, EM TERMOS FIXOS e, neste sentido, como já demonstrado acima, tendo em vista que a norma daquele dispositivo é impositiva, as empresas não podem, legalmente falando, efetuar o pagamento do imposto, por valores fixos mensais, estando, assim, o ente federado municipal impedido de efetuar qualquer cobrança àqueles contribuintes, enquanto não elaborar e publicar norma específica que regule o pagamento do imposto, para as microempresas e empresas de pequeno porte, prestadoras de serviços contábeis, caso optantes do Simples Nacional.
Entretanto, um aspecto mais do que relevante, deve ser levado em conta, em relação às conclusões acima, no que diz respeito à determinação prevista no § 3º doart. 9º do Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968- DL nº 406/68, considerado pela Doutrina e Jurisprudência dominantes, como ainda vigente, apesar da edição daLei Complementar Federal nº 116, de 31 de julho de 2003- LC nº 116/2003, atual lei de regência do ISSQN.
Com aquele dispositivo, as chamadas sociedades simples de profissão regulamentada, nas quais se incluem as de serviços contábeis, e tendo em vista a regulação de cada um dos municípios brasileiros, já efetuam o pagamento do imposto, em valores fixos mensais, calculados por cada um dos profissionais habilitados, sócios, empregados ou não, que prestem serviços em nome da sociedade.
Neste sentido, duas situações podem advir desse fato, em relação aos prestadores de serviços contábeis:
Primeira situação: quando a sociedade for constituída sob a forma de sociedade simples, de profissão regulamentada.
Neste caso, as sociedades já estarão efetuando o pagamento do imposto, na forma doart. 9º, § 3º do DL nº 406/68, situação regulada, em cada município, por meio de suas leis tributárias e, desta forma, a norma doart. 18, § 22-A funcionaria como uma norma geral, sendo as anteriores, dos municípios, que já regulam a cobrança do imposto, de acordo com oDL nº 406/68, normas específicas e em pleno vigor.
Segunda situação: quando a sociedade for constituída sob a forma de sociedade empresária
Neste caso, o meu entendimento é de que haverá a necessidade de regulamentação municipal, nos termos do que determina expressamente a parte final do texto do parágrafo 22-A doart. 18 da LC nº 123/06, cabendo, neste caso, o teor da quarta conclusão acima.
Outro fato a ser observado é que as sociedades que prestem serviços contábeis, para acesso, bem como para a manutenção dos benefícios dispostos naLC nº 123/06, aqui estudados, deverão atentar para as obrigações dispostas no parágrafo 22-B, sob pena de serem excluídas do Simples Nacional, conforme estabelecido no parágrafo 22-C, ambos doart. 18, quais sejam:
a) promover atendimento gratuito relativo à inscrição e a primeira declaração anual simplificada, em relação aos microempreendedores individuais - MEI;
b) fornecer, na forma estabelecida pelo Comitê Gestor, resultados de pesquisas quantitativas e qualitativas relativas às microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional por eles atendidas; e
c) promover eventos de orientação fiscal, contábil e tributária para as microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional por eles atendidas.
Por tudo que vimos, o leitor poderá indagar: se o município não regula oart. 18, § 22-A, e a empresa de serviços contábeis, por isso, não efetua o pagamento do imposto, como ficará o ISSQN, para os meses em que a empresa não teve condições legais de fazer o recolhimento? O município irá perder o imposto?
Para as duas questões acima, caberiam as seguintes respostas:
Primeira: como o meu entendimento é de que as normas doart. 18, § 22-A são de caráter impositivo, o município tem a obrigação de regular este dispositivo. Neste caso, não o fazendo, o fato de não poder efetuar a cobrança do imposto devido, funcionará como punição para o não cumprimento da determinação da lei complementar;
Segunda: quando da edição da norma regulamentadora, esta deverá ser de forma retroativa ao dia 1º de janeiro de 2009, data em que passou a viger as determinações daLC nº 128/08, que incorporou, àLC nº 123/06, os benefícios aqui estudados;
Terceira: caso alguma empresa prestadora de serviços contábeis tenha efetuado o pagamento de algum valor, a título de ISSQN, calculado, por exemplo, a partir da sua receita bruta, com aplicação das alíquotas constantes das tabelas anexas à Lei Geral, entendo que devam ser adotados os seguintes procedimentos:
1) se os valores pagos forem inferiores ao devido, a diferença deverá ser cobrada, observando-se o que determina oart. 100, parágrafo único daLei Federal nº 5.172, de 25 de outubro de 1966- Código Tributário Nacional - CTN:
Art. 100. (...)
Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor monetário da base de cálculo do tributo.
Portanto, não caberá a cobrança de acréscimos moratórios, pois o atraso não teria sido causado pelo contribuinte, mas pela própria Fazenda Municipal, por não ter regulado oart. 18, § 22-A da LC nº 123/06; ou
2) Se os valores pagos forem superiores ao devido, a diferença existente, entre o valor pago e os valores que deveriam ser recolhidos, apurados por meio de regras que estabeleçam o ISSQN fixo, poderá ser objeto de repetição, nos termos dosarts. 165 e seguintes do CTN.
Por último, uma situação que pode esconder uma "armadilha" para algumas empresas, não só de serviços contábeis, tendo em vista o texto normativo do parágrafo único doart. 17 da LC nº 123/06:
"Art. 17. (...)
(...)
§ 1º As vedações relativas ao exercício das atividades previstas no caput deste artigo não se aplicam às pessoas jurídicas que se dediquem exclusivamente às atividades referidas nos §§ 5º-B a 5º-E do art. 18 desta Lei Complementar, ou as exerçam em conjunto com outras atividades que não tenham sido objeto de vedação no caput deste artigo".
Pelo que se depreende da leitura atenta do parágrafo primeiro doart. 17, o legislador complementar impôs duas condições para que as empresas prestadoras de serviços possam optar pelo Simples Nacional:
Primeira: as entidades devem exercer, COM EXCLUSIVIDADE, as atividades descritas nos §§ 5º-B ao 5º-E; ou
Segunda: se a empresa exercer outras atividades, em conjunto com aquelas previstas nos §§ 5º-B ao 5º-E, aquelas outras atividades deverão ser, obrigatoriamente, autorizadas a que as empresas que as exerçam, possam optar pelo Simples Nacional.
Neste sentido, para que uma empresa que presta serviços contábeis exerça a opção pelo Simples Nacional, somente poderá exercer a atividade de contabilidade. Entretanto, se além de prestar esses serviços, também prestar, por exemplo, serviços de auditoria, atividade integrante do subitem 17.16, ou de consultoria e assessoria econômica ou financeira, atividades integrantes do subitem 17.20, ou as atividades de instrução e treinamento, constantes do subitem 8.02, todas da Lista de Serviços anexa àLC nº 116/03, o que, diga-se de passagem, não são atividades distantes da atividade contábil, a empresa estaria, automaticamente, impedida de exercer a opção pelo Simples Nacional, já que estas não são atividades, cujas empresas prestadoras dos serviços possam optar pelo Simples Nacional e, por consequência, a empresa não poderá efetuar o pagamento do ISSQN em valores fixos mensais.
Notas
(01) Não é apenas o ISSQN. De acordo com o texto do art. 18, § 18 da LC nº 123/06, também o imposto estadual sobre operações relativas á circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação - ICMS poderá, desde que haja interesse dos Estados, ser pago por valores fixos.
(02) Para se ter uma ideia, segundo estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tibutário - IBPT, até 2008, 20 (vinte) anos depois da promulgação da Constituição, foram editadas, nos âmbitos federal, estadual e municipal, mais de 240 (duzentas e quarenta) mil normas tributárias (http://www.ibpt.com.br/img/_publicacao/13081/162.pdf).
(03) Já regulado por meio do art. 33 da Res. CGSN nº 94/11.

Geovane Basilio da Silva
Auditor Tributário do Município de Jaboatão dos Guararapes/PE, atualmente na função de Julgador Tributário da Primeira Instância Administrativa. Pós-Graduado em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET. Pós-Graduado em Contabilidade e Controladoria de Entidades da Administração Pública -UFPE. Graduado em Ciências Contábeis - UFPE.
 
Fonte: FISCOSOFT